terça-feira, 26 de setembro de 2017

Qual a fronteira do patrocínio?

O céu é o limite quando se pensa em ativação de patrocínios.
Na Inglaterra, o Bendale AFC - um clube semiprofissional - tem sua camisa ornamentada por desenhos de salsichas. Isso mesmo, por ser patrocinado por um fabricante desse produto - a Heck - o clube decidiu customizar um de seus uniformes com a citada iguaria.
Devido ao fato de se tratar de um clube sem sólida estrutura profissional direcionaremos nossa análise ao conceito e não à instituição que, provavelmente, não deve estar se importando muito com as consequências da iniciativa, nem tampouco com a estética do uniforme.
A adoção desse tipo de prática é, no meu modo de ver, bastante maléfica à organização patrocinada, pois um espaço demasiadamente dedicado à marca do patrocinador desvaloriza seus símbolos. Enquanto que para o patrocinador esse tipo de divulgação pode até ser vantajoso, já que outros potenciais interessados no espaço precisariam investir um montante expressivo para que a “parceria” anterior seja esquecida e a nova percebida, o que acaba inibindo eventuais propostas, e assim garante uma espécie de reserva de mercado para a marca atual.
Há também que se considerar que, caso o patrocinador decida alterar o produto a ser divulgado, o uniforme precisará sofrer alterações bem radicais, o que envolve inclusive as cores.
E já que tocamos no assunto do design, convém lembrar que o fornecedor de material esportivo fica bastante vulnerável na situação mencionada, visto que uma mudança de patrocínio faz com que todo o uniforme que esteja no mercado sofra uma forte desvalorização. A propósito, é justamente em função do risco de mudança de patrocinador que a maioria das camisas comercializadas no varejo não trazem a marca deste, e reparem que nesse caso o que muda é apenas o cromo.
Claro que a desvalorização do produto também ocorre às vésperas dos lançamentos das novas versões, essas, porém, não costumam sofrer alterações bruscas no design, nem na essência.
Para ilustrar o artigo com um fato real, vale citar um caso ocorrido em 2005 com a Confederação Brasileira de Voleibol, que tentou alterar as cores dos uniformes da seleção - preto no masculino e rosa no feminino - para, segundo se comentou na época, se desassociar do amarelo e do azul, cores que coincidentemente são as mesmas do seu patrocinador, o Banco do Brasil. 
Ações como as do clube inglês corroboram para deixar ainda mais evidente que patrocinados e patrocinadores enxergam ainda os uniformes como um mero veículo de mídia, quando na verdade deveriam encará-los como uma plataforma que representasse os valores e propósitos da instituição, de forma que o patrocínio também se aproveitasse dessas características ao associá-las a sua marca, mas sobre isso não vou me estender, pois tal assunto já rendeu inúmeros artigos nesse blog.
Diante do argumentado não parece razoável supor que um patrocínio que chegue ao ponto de se customizar toda a camisa do clube com seus produtos seja salutar, o que não significa que uma marca não possa ter uma relação mais forte com algum time, mesmo porque há a possibilidade de a própria empresa ser proprietária da equipe, vide o caso da Red Bull.



terça-feira, 19 de setembro de 2017

Patrocínio, mecenato...

Sempre que surge um novo patrocinador no esporte, principalmente quando esse investe uma cifra acima da média do mercado, começam as discussões sobre a viabilidade do patrocínio.
De fora especulam que o investimento não se paga e que não se trata de patrocínio, mas de mecenato. No lado oposto, os que defendem a iniciativa utilizam números "bem escolhidos" que avalizam o retorno.
Na maioria das vezes, esse patrocínio - em tese fora da curva -  advém de empresas cujos mandatários acabam personificando a instituição e, para jogar mais combustível na discussão, são torcedores do clube patrocinado.
Outro ataque a esse tipo de patrocínio vem com o argumento de que ao final da parceria o clube passará por um período quase falimentar.
Inicialmente tendo a achar que os valores pagos pelo patrocínio ainda não estão suficientemente consolidados a ponto de poderem ser avaliados tendo como parâmetro o mercado. Até porque nessa avaliação de valor precisariam considerar o segmento, o posicionamento mercadológico do patrocinador, as alternativas de investimento, a conjuntura macroeconômica do país e a atuação da concorrência.
O fato de o responsável pela empresa personificar o patrocínio é, em minha opinião, nocivo para a marca que deveria ter vida própria e livre de qualquer tipo de contaminação por seres humanos, além do que, quanto mais “única”, maior a probabilidade de se destacar.
Já a alegação de que ao final da relação o futuro será sombrio não me parece razoável, mesmo porque é impossível garantir que não venha como substituto outro patrocinador da mesma magnitude. Lógico que as chances de que isso aconteça são menores, porém, se o período das "vacas gordas" for gerido com responsabilidade, os investimentos em infraestrutura serão contemplados de modo que o impacto com a eventual queda de receitas seja menos traumático. 
Levar essa argumentação adiante é o mesmo que preconizar viver com pouco dinheiro no presente para se acostumar com os momentos ruins no futuro.
Já os que  justificam o valor investido através dos indicadores financeiros e mercadológicos, precisam tomar cuidado para que suas argumentações não esqueçam que o patrocínio é apenas uma das atividades que permeiam um plano de ação. Além dele, há toda uma política comercial, uma estrutura de distribuição, um cenário mercadológico e econômico, além de outras atividades ligadas à divulgação e posicionamento das marcas.
Creditar um bom ou um mau desempenho da empresa apenas ao patrocínio é injusto.
Na verdade, nem mesmo é possível afirmar com absoluta certeza sobre o retorno da iniciativa, já que certas variáveis tais como a atuação da concorrência, por exemplo, são difíceis de serem incluídas na avaliação com o devido grau de proporcionalidade.
Não obstante a isso, as discussões são livres e benéficas, só não podemos esperar verdades absolutas como respostas, pois se trata de uma avaliação com um número expressivo de variáveis exógenas e que não conseguem ser isoladas.


terça-feira, 12 de setembro de 2017

Temos que ouvir o cliente!

Temos que ouvir o cliente!
Essa frase se tornou um brado por parte de todos os gestores que entendem a importância dos seus clientes, independentemente do segmento em que suas empresas atuam. 
É comum também ouvir como continuação dessa frase alguma sustentação quantitativa preconizando que o custo para se conquistar um cliente é x vezes maior do que para mantê-lo. Despejam esse valor sem especificarem sobre qual segmento que estão se referindo, tampouco a metodologia que utilizaram para chegar a tal valor, o que faz a sentença assemelhar-se com os enfadonhos jargões que habitam as conversas corporativas de quem não tem o que dizer.
Não percebem que, dependendo do ramo de atividade, o tal x varia.
E nem me refiro aqui a cenários que contemplem os conceitos de oligopólio e monopólio, tampouco entro no mérito teórico dos princípios microeconômicos ou das conjunturas macroeconômicas, que certamente influenciariam também o valor de x.
A razão do questionamento à correlação preconizada tem origem na primeira frase desse artigo: “temos que ouvir o cliente”, com a qual concordo, que fique claro, porém, adianto que apenas ouvi-los é muito pouco. Temos que ouvir também os “não clientes”, entre os quais estão incluídos os ex-clientes, as pessoas que já estiveram propensas a se tornar clientes, os que nunca pensaram nessa possibilidade e os que rejeitam a hipótese.
Esse contingente tem o poder de ampliar o horizonte de demanda, visto que no caso da simples manutenção dos clientes - o que também é importantíssimo -, as perspectivas de incremento de receita se resumem ao maior consumo unitário desses ou no aumento do preço, ao passo que novos clientes trazem as mesmas possibilidades, além, obviamente, de novas receitas.
Para ficarmos na esfera esportiva, vamos citar o case da Callaway Golf, cadeia varejista norte-americana especializada em artigos de golfe. Essa empresa, com o intuito de crescer a demanda de seus produtos, resolveu investigar a razão que levava as pessoas que gostavam de praticar esportes a não optar pelo golfe.
Na pesquisa descobriu que a dificuldade em se acertar a bola levava à frustração e à consequente rejeição da modalidade.
Com base nessa constatação desenvolveu um taco – o Big Bertha – com uma “cabeça” maior, que facilitaria o “acerto” na bola. O produto foi sucesso não apenas perante aos novos entrantes mas também junto aos que já eram clientes.
Esses e outros exemplos nos mostram que é inconcebível trabalhar o marketing sem ouvir os “não clientes”, os quais são vitais para o aprimoramento dos produtos ofertados e na identificação de um possível desconhecimento acerca da existência das características dos mesmos, isso sem falar nos demais aspectos que podem levar os consumidores a preteri-los, como o preço por exemplo.
Por fim, creio ser impossível existir uma relação digna de ser preconizada entre "custo de reter vs. custo de conquistar", pois, mesmo que houvesse, ela não faria o menor sentido se não viesse agregada às perspectivas de receitas em cada um dos casos.
Temos que ouvir o “não cliente”, também!




terça-feira, 5 de setembro de 2017

Nada contra ser contra

Diferentemente do ambiente corporativo, a gestão de um clube de futebol ou mesmo de uma confederação costuma ter um componente que, se mal utilizado, pode vir a prejudicar toda a condução da organização. Refiro-me à oposição.
Talvez o fato de ter praticado esporte desde a infância tenha me feito acreditar que a existência de adversários era algo benéfico, pois esses fariam com que a busca pela superação fosse constante. Evidentemente falo de adversários que atuem de forma limpa e ética, sem nenhum tipo de transgressão na busca pela vitória, afinal de contas, todos representam uma modalidade esportiva que aprenderam a amar e que não deve ser manchada. Além do que, o esporte é algo muito nobre para ser arranhado por práticas desleais.
Sendo assim nada mais natural do que esperar que num clube ou numa confederação o processo fosse similar, ou seja, os opositores, mesmo divergindo em alguns pontos, existiriam para somar e agiriam dentro dos mais rígidos princípios morais.
E como seria esse exercício de adição? Penso que questionando de forma honesta os pontos de divergência, sugerindo soluções e sempre tendo em mente que todos querem o bem daquela instituição.
É até tolerável que os que nunca estiveram na gestão acreditem que tenham a fórmula ideal para a resolução de cada problema - apesar de isso implicar numa prepotência pouco salutar - e que extravasem suas inquietudes, de preferência pessoalmente e de forma educada, já que atrás de um teclado a valentia se confunde um pouco com covardia. Ah, as redes sociais...
O que considero inadmissível é a postura dos que já exerceram algum cargo, conhecem bem os desafios e ainda assim preferem fazer um tipo de oposição que carrega naquilo que aparenta ser ruim e minimiza o que parece ser positivo. Deixam assim a ética de lado e a própria credibilidade reduzida a algo perto de zero.
Difícil entender o que passa pela cabeça dos usuários dessas práticas pérfidas. Seriam pessoas mimadas que esperneiam pela vontade não ter prevalecido? Talvez maus perdedores? Ou cidadãos frustrados pela única esperança de sucesso na vida ter sido abortada pela democracia?
Que fique claro que as críticas aos "opositores" ruins não fazem referência ao presente, nem a nenhuma instituição específica. Longe disso, ela se aplica a todos, inclusive aos que hoje fazem parte da situação, mas que no passado tiveram o mesmo tipo de postura mesquinha e vil. Ou seja, o texto é conceitual e não factual, o que me leva a conter a tentação de ilustrar o texto com exemplos.
O intuito do artigo é mostrar o quão difícil é governar, pois, além dos desafios que qualquer cargo requisita, há ainda a ação dos abutres que podem algumas vezes desviar a atenção e a energia dos que operam no dia a dia para debates que nada acrescentam à instituição. Na verdade nem sei se o abutre é o animal que melhor representa tal tipo de pessoa...
Por essas e por outras que considero a gestão de uma organização esportiva – ou de qualquer poder executivo público - bem diferente da que ocorre em uma empresa, o que não significa que as boas práticas de governança não possam ser adaptadas ao modelo, aliás, muito pelo contrário. Defendo fortemente a vinda de executivos com experiência corporativa para integrarem os grupos políticos e participarem da gestão de confederações e clubes.
A vinda desses ajudaria não apenas na implantação das ferramentas e conceitos corporativos, como também na formação de uma oposição inteligente, sem recalques e que tenha como único interesse o bem da instituição.